Ícone da Espiritualidade

O Ícone da Espiritualidade da Congregação das Irmãs de São José

  Icona

O carisma que ao longo dos anos foi esculpido e gravado na história, inscrito dentro dos nossos corações, os ventos do tempo colocaram novamente diante de nós. Dom do céu e da Terra escrito por pensamento, inspiração e trabalho.

Convido Você, a ir mais a fundo e ler os sinais escritos por um coração amoroso. O Ícone é a obra da comunidade. Nasce das profundezas de tarefas de pesquisa, história e experiência. Desde os primeiros pensamentos, perguntas, sugestões, abertura e autori-zação, por meio de reflexão, oração e fé, mesmo no impossível. Foram feitas perguntas em nosso capítulo geral de como entender e perceber hoje o carisma da Congregação e a sua compreensão em profundidade e amplo significado. Posteriormente procuramos respostas. O tempo passou e o Espírito Santo selecionou as ideias. Até que, finalmente, algo começou a nascer… O tempo para a maturação do projeto, refinamento dos elementos e seu significado no ícone. Posicionamento dos personagens, expressividade dos seus gestos e relacionamentos. E ao mesmo tempo a oração, jejum, atos de amor e ascece, livremente escolhidos por muitos. Ajustamento com Deus e com as pessoas. E finalmente as mãos iniciaram o trabalho; grafia, ouro, tinta misturada com oração, fortalecidas com perdão e com a unidade de espírito e ideais. Continuando, o ícone escreve-se sozinho, surgem as ideias e naturalmente a geometria do Ícone se ajusta. Flui a fé da Igreja, o Espírito da Congregação e fala com poder… Formam-se os esboços.. outras pessoas estão envolvidas no trabalho e acrescentam a sua parte.

Une-se o poder de Deus e o esforço humano. As figuras estão passeando em cima da tábua, o seu espírito grava-se e penetra os autores. Os Santos encontram o seu lugar no ícone e começam a falar. A fé mistura-se com a esperança para na face frontal do ícone emergir a espiritualidade e mostrar a essência do carisma – o AMOR. E assim aconteceu. Soprou com suavidade o espírito renovado… De forma clara e singular começamos a ler o Ícone escrito – obra da Comunidade. Juntos estamos entrando nele, alinhando-nos com Àqueles que estão caminhando à nossa frente. Eis a Comunidade de graça e de dom.

 

Este ícone nos leva para as preparações das celebrações de uma década da canonização de São Sigismundo Gorazdowski, que foi elevado aos altares no dia 23 de outubro de 2005. Agradeço a Irmã Wirginea Pasternak e toda a equipe das Irmãs pela contribuição da criação deste Ícone e também pelos conselhos competentes e especiais dos escritores de ícones: Pe. Zykfryd Kot, SJ e Pe. Dr. Dariusz Klejnowski – Rozycki.

Ir. M. Leticja Niemczura, Superiora Geral CSSJ

Contemplação do Ícone da Espiritualidade 

da Congregação das Irmãs de São José

Texto: Ir. M. Jana Przetak – Vigária Geral CSSJ e Ir. M. Wirginea Pasternak CSSJ

O ícone é um mistério da presença divina, e ao mesmo tempo aquele gênero de arte cristã que alia em si o que é corporal com o que é espiritual. No Antigo Testamento Deus basicamente se revelou através da palavra. A partir do momento em que o Verbo se fez Carne, o invisível torna-se visível, visto que Jesus Cristo tornou-se o Ícone do Deus Invisível (cf. Cl 1,15), “que é o resplendor de sua glória e a expressão do seu Ser” (Hb 1,3). Além disso, também aqueles que amam a Deus foram por Ele predestinados a serem conformes à imagem de seu Filho (Rm 8,29).

Na iconografia todo personagem tem uma legenda. A legenda é um elemento muito importante, visto que, segundo a teologia e a antropologia contidas na Bíblia, conhecer alguém pelo nome é penetrar em seu coração, permanecer com ele em convivência próxima. Nesse ícone as legendas aparecem em língua latina, que é a língua da Igreja Católica, e da nossa Congregação – como uma parcela sua – que se propaga cada vez mais em diversos países do mundo, empenha-se pela sua unidade. Apenas as legendas de Jesus e de Maria conservam as suas abreviaturas gregas originais.

Desejando penetrar no mistério do ícone, é preciso abrir-se ao que está oculto no simbolismo e nas cores[1]. Somente então o sinal material, que é a pintura sobre uma tábua, enche-se de vida e deixa de ser apenas uma imagem[2]. Em outras palavras, do ícone podemos aproximar-nos como de um texto. Visto que o ícone foi escrito, ele pode ser lido[3]. Visto que o ícone é um Mistério, podem nele penetrar apenas aqueles que possuem um olhar espiritual penetrante, um inteligente olhar do coração, aqueles que, contemplando o ícone, com ele começam a rezar[4]    

 Vinde, Espírito Santo, renovai em mim a fé, despertai o desejo de me encontrar convosco, Deus Vivo. Abri hoje para mim a janela deste ícone. Para que isso seja possível, em meu coração faço agora o ato de perdão e de reconciliação diante daqueles com os quais não tenho paz… com meus irmãos, com as irmãs, com a comunidade[5]. Vinde, Espírito Santo, introduzi-me no silêncio do amor do Pai, permiti que eu penetre profundamente no mistério da espiritualidade da minha Família religiosa, que é uma parcela da Vossa Igreja, enriquecendo-a com o dom carismático dado por Vós para dar o testemunho no mundo a respeito de um aspecto selecionado do mistério de Cristo[6]. Vinde, Espírito Santo, iluminai-me e conduzi-me…

Iniciaremos a interpretação do ícone com o significado simbólico dos materiais sobre os quais repousa a pintura. A tábua, porque nela está inscrito o ícone, pelo seu simbolismo alude à árvore da vida do paraíso e ao “lenho sobre o qual pendeu a Sal-vação do mundo”, e comprova a no-ssa fidelidade ao único Amor, que se manifesta e tempera na húmil-dade da vida ocul-ta e no sofrimento aceito, para com-pletar no próprio corpo “o que falta das tribulações de Cristo” (Cl 1,24). Sobre a tábua está colada a tela, lembrando o Santo Lenço – Mandílion, que possui o poder de curar. Por isso o ícone, em razão do seu relacionamento com a Pessoa de Jesus Cristo tem sempre um aspecto terapêutico[7]. Sobre a tela estão coladas 12 camadas de um mordente de giz e cola. Esse número lembra simbolicamente as 12 tribos de Israel (cf. Js 4,1-13), bem como os Apóstolos, sobre o fundamento dos quais está edificada a Igreja, cuja pedra fundamental é o próprio Jesus Cristo (cf. Ef 2,20). No centro do Corpo Místico de Cristo encontra-se a vida consagrada, visto que, refletindo a forma de vida de Jesus, é a que melhor expressa a natureza da Igreja. 

O ícone é composto em forma de retângulo. A parte inferior da composição representa a Congregação das Irmãs de S. José realizando o seu carisma na terra, e a parte superior, em luz dourada, fechada num quadrado, é a realidade sobrenatural. Exatamente no centro da composição da parte superior, no encontro das diagonais do quadrado, está localizado Jesus – o Verbo Encar-nado, o que significa que Jesus Cristo se encontra no centro da espiritualidade da Congregação das Irmãs de São José. Ele é a fonte do carisma da Congregação, molda a sua imagem segundo o espírito do Evangelho e o concretiza na história do mundo[8]. O conteúdo do carisma está inscrito no Livro aberto na mão de Jesus: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei. Nisso conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (cf. Jo 13,34-b-35). Paremos o olhar em Jesus. Ele é o Emanuel – “Deus Conosco” que olha para nós com um olhar amoroso e está inclinado para nós, como se dissesse: “Eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28,20) e nos convida a estreitarmos os laços de amizade pessoal com Ele, para que possamos melhor envolver-nos na obra da Sua salvífica missão, que Ele veio para cumprir no mundo. Com uma mão Jesus abençoa e na outra segura o Livro aberto da Palavra Divina, para nos transmitir que a norma suprema da nossa vida consagrada é a Sua imitação, apresentada justamente no Evangelho[9].

Jesus está vestido com uma túnica branca com uma gola ornamental, o que significa a divindade de Cristo, e com o “himátion” – um manto exterior de cor verde, que simboliza a doação da vida e o vínculo com o Espírito Santo. A submissão à Sua ação santificante condiciona o desenvolvimento correto da vida religiosa, bem como a intensidade da amizade pessoal vivenciada com Deus. A cabeça de Cristo está cercada por uma auréola, por um nimbo em forma de cruz, no qual está inscrito abreviadamente o Nome de Deus: “Eu sou aquele que é” (Ex 3,14). O nimbo em forma de cruz é um sinal eloqüente de que a glória de Cristo é a Sua Cruz. Isso nos conscientiza de que o amor que brota do coração de Deus é inseparável do sacrifício e da cruz. A figura de Cristo está inscrita num círculo; igualmente na geometria do ícone há muitos círculos ocultos que simbolizam a plenitude e a perfeição que devemos incessantemente buscar.

A direção vertical da composição do ícone apresenta a Santíssima Trindade: Jesus Emanuel, o Espírito Santo em forma de pomba e a Mão da Providência de Deus Pai, conscientizando-nos de que a comunidade religiosa, da mesma forma que toda a Igreja, é um reflexo do mistério de Deus em Sua vida trinitária, chamada a viver na unidade que Jesus desejava e que pediu ao Pai para todos os Seus discípulos[10].

Olhemos agora para Maria, que no ícone é apresentada como orante, ou seja, Intercessora, e ao mesmo tempo Virgem do Sinal (cf. Is 7: 14), representando a Encarnação do Verbo de Deus. Essa vinculação da figura da Mãe de Deus e de Cristo no seio dela representa um dos mais profundos mistérios: o nascimento de Deus num corpo. Igualmente a riqueza do ouro que ornamenta as Suas vestes simboliza a Luz celestial que desceu à Terra por intermédio da Mãe de Deus[11]. Nesses símbolos iconográficos apresenta-se a nós o Santo dos Santos, o interior de Maria, em cujo seio, do Espírito Santo, é concebido o Deus-Homem: o Seu seio tornou-se maior que o céu[12]. Todo aquele a quem Deus chamou e enviou deve conquistar e gerar almas para Cristo. A maternidade espiritual realiza-se através da palavra viva, que é o fruto do contato contemplativo com Deus, pela oração da plena entrega a Deus, e principalmente pelo sacrifício e pelo sofrimento. No ícone Maria é representada frontalmente, solene-mente erguendo os braços, no que se expressa toda a força da Sua vida interior e a Sua piedade. Vemo-La no momento em que se encontra diante de Deus, pronta a dar a resposta: “Eu sou a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1, 38). Os Seus braços estão erguidos num impulso de oração intercessora, e as mãos estão abertas, prontas a aceitar a todos. É a Virgem Imaculada, Cheia de Graça[13], Concebida sem qualquer mancha de pecado, Mediadora das Graças, Mãe, Senhora e perfeito modelo de santidade.

As vestes de Maria são as tradicionais: o mafórion vermelho – o lenço na cabeça de Maria, que cobre toda a Sua figura, e um vestido azul. As suas cores simbolizam a união, na pessoa de Maria, da virgindade e da maternidade, da Sua natureza terrena e da vocação divina. A Sua tríplice virgindade (antes, durante e após o nascimento de Cristo) é enfatizada por três estrelinhas nos ombros e na testa, e o símbolo da Imaculada Conceição de Maria são os punhos brancos e dourados nas mangas do vestido. Maria é a Porta dos Céus, porquanto através dela Deus ingressou na história da Terra ligando-se com os homens tão estreitamente que se tornou um de nós. Na parte inferior o mafórion é purpúreo, o que é um sinal da Sua dignidade Real, bem como uma apresentação simbólica do Santuário do Altíssimo, do Santo dos Santos, que no templo estava oculto por um tecido escarlate. Durante a morte de Jesus esse véu “rasgou-se ao meio” (Lc 23,45). Maria se transformou num Santuário desse gênero. “E vós? Não sabeis que sois um templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós?” (1Cor 3,16)

Um pouco acima, de ambos os lados de Maria, estão representadas as potências celestiais – um Anjo vestido de branco e um Serafim vermelho como o fogo. A presença na composição das potências celestiais, em referência a Maria, significa que, pelo Seu humilde consentimento para participar do ato da Encarnação de Deus, a Mãe de Deus ergue a humanidade a um grau mais elevado que os anjos, visto que Deus não assumiu a semelhança dos anjos, mas revestiu-se de um corpo humano[14]. “O que é o homem, para que dele te lembres? Ou o filho do homem, para que o visites? Fizeste-o, por um pouco, menor que os anjos, de glória e de honra o coroaste, e todas as coisas colocaste debaixo dos seus pés” (Hb 2,6-8).

Em estreito relacionamento com Maria e Jesus – como se vê no ícone – encontra-se São José, Esposo da Imaculada, a quem Deus convocou a um serviço excepcional ao Verbo Encarnado e que se tornou um confidente especial “do mistério oculto desde os séculos em Deus” (cf. Ef 3, 9)[15]. Como Esposo e virgem Cônjuge de Maria, para o que aponta o lírio branco a seu lado, S. José é apresentado de forma dinâmica, numa postura de prontidão e de generosidade diante dos propósitos divinos, o que nos estimula a nos perguntarmos: qual é a minha disponibilidade e generosidade no serviço a Jesus? A forma como São José é apresentado no ícone nos faz lembrar o mistério da Apresentação de Jesus no Templo, durante a qual deviam também “oferecer em sacrifício, como vem dito na Lei do Senhor, um par de rolas ou dois pombinhos” (Lc 2,24). O momento da apresentação é como que uma troca mútua entre o Pai Celestial e o protetor terreno. É um símbolo inconcebível da intimidade do Criador e da criatura e uma imagem de imenso amor, porque ao sacrifício do coração humano Deus responde com a graça que produz fruto perfeito[16]. A fidelidade de S. José à lei mosaica conscientiza-nos de que devemos viver segundo as normas contidas na legislação, porque elas são um caminho seguro para uma total entrega a Deus e fornecem eficazes orientações para a vida diária na consagração religiosa[17].

Nesse ícone, S. José está todo voltado em direção a Jesus e a Sua Mãe. Veste um manto interior de uma cor que na iconografia é chamada “sinyj” – cinzenta, que significa o que é terreno, para mostrar que na trivialidade da vida diária ele tinha um coração que vivia com o amor, os pensamentos e o olhar concentrados no Verbo Encarnado, que proporcionava o mais profundo sentido à sua vida.  Por sua vez o himátion – o manto exterior é de cor rosa escuro. É a cor que simboliza a profunda alegria e a esperança de S. José, que aprendeu a haurí-las da ilimitada confiança em Deus em tudo com que se defrontava, inclusive nas trevas da fé. O seu ardente amor conjugal a Maria, repleto de respeito, discrição e profunda sensibilidade, que com a sua postura ele ensinava a Jesus, é para nós um fortalecimento no caminho da castidade prometida a Jesus, num íntimo relacionamento com Ele.

Do lado esquerdo de Maria vemos São Francisco de Assis, em postura de adoração, humilhação e amoroso respeito a Maria e a Seu Filho Jesus. Na contemplação dos Mistérios Divinos realiza-se, com efeito, a mais pro-funda formação espiritual – o processo da identificação da esposa com o seu Esposo. A semelhança espiritual de S. Francisco com Cristo é simbolizada pelos estigmas que ele recebeu de Deus por intermédio do Serafim[18], a quem vemos no canto superior direito do ícone. A regra fundamental da sua vida era o Evangelho, o que é simbolizado pelo Livro da Palavra Divina presente em sua mão esquerda, que em sinal de respeito ele segura através de um tecido. O Santo Pobrezinho de Assis, como ninguém outro, aceitou a Palavra Divina e permitiu que essa Palavra o transformasse de tal forma que se tornou como que outro Cristo (cf. Ga 2, 20). Ele permitiu ser conduzido por Deus e, tendo ouvido a misteriosa voz de Deus “Francisco, vai e reconstrói a minha Igreja!”[19], respondeu com profunda e radical obediência a Deus e à Igreja. Desejando imitar perfeitamente a Cristo, contemplava a cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, que no ícone ele segura na mão direita. Viveu na pobreza, na simplicidade e na humildade, o que se expressa pelo hábito de cor bronzeada – sinal de ascese e de um estilo de vida penitencial. Ele sabia, com efeito, que assumir a cruz diária e praticar a penitência permite viver mais plenamente com o amor evangélico e direciona para a busca exclusiva do Reino de Deus[20].

Olhemos agora para Santa Isabel da Hungria – Princesa da Turíngia, a quem o amor a Cristo Crucificado estimulava a um devotado e ativo amor às pessoas mais necessitadas, visto que acreditava que o encontro com elas é um encontro com o próprio Deus. A sua origem principesca é simbolizada pela cor purpúrea da pelerine, que por baixo é de cor verde – sinal de esperança, que tão fortemente se irradiou em sua vida. A simples túnica cinza de S. Isabel como terciária da Ordem Terceira de S. Francisco mostra que a maior dignidade do homem é servir à causa do Reino de Deus e conduzir o semelhante não apenas ao encontro com Jesus, mas à identificação e a uma profunda intimidade com Ele[21]. Estimulada pela Carta a todos os fiei[22], escrita por São Francisco, desejou viver como ele – radicalmente segundo o Santo Evangelho. Ela realizou esse desejo com uma vida heróica, que era verdadeiramente um Hino à caridade, a respeito do qual escreve S. Paulo na sua I Carta aos Coríntios (1Cor 13,1-13). Santa Isabel é para nós um modelo, não apenas da caridade cristã, mas também da criativa vivência do sofrimento e das mágoas, da fidelidade a Deus tanto nas dificuldades como na abundância, bem como um exemplo de boa vivência da perda dos familiares, do lar, do bom nome. De fato, ela crescia em Cristo juntamente com cada nova perda, aparente derrota na vida[23].

Nesse ícone há mais uma figura no círculo dos santos, muito importante para toda josefita. É o nosso Padre Fundador, São Sigismundo Gorazdowski. No ícone ele é representado bem próximo de S. José, Padroeiro da Santa Igreja, visto que toda a sua vida sacerdotal foi assinalada pela fidelidade à Igreja e aos seus Pastores, o que é expresso pelo solene traje de Camareiro pontifício[24]  com que está vestido. Ele apreciava o dom do sacerdócio e agradecia a Deus “por se ter dignado chamá-lo ao estado sacerdotal e porque nesse santo estado lhe proporcionou tantas graças e possibilidades de fazer o bem pelos (seus) compatriotas[25]. A vivência do Sacrifício de Cristo o conduzia aos doentes, pobres e necessitados. […] Sempre agiu em espírito de comunhão, que plenamente se revela na Eucaristia”[26].  No ícone o Padre Sigismundo é apresentado numa postura dinâmica. Com a mão direita ele abençoa a Congregação, a fim de que se propague para a glória de Deus e o proveito da humanidade sofredora. A mão erguida do Padre Fundador pode também ser interpretada como uma forma de mostrar a realidade sobrenatural para nos ensinar que o nosso ministério da caridade será eficaz quando depositarmos toda a esperança no paternal amor de Deus e na Sua Providência e quando Cristo for a fonte dos nossos sentimentos e do nosso zelo apostólico[27].

Com a mão esquerda, por sua vez, ele aponta para o lema da Congregação, para o símbolo do carisma recebido do Espírito Santo e o transmite às Irmãs, estimulando-as para que estejam sempre presentes onde ecoa o grito do sofrimento humano. O gesto da mão esquerda, dirigido no ícone às pessoas que se encontram na realidade terrena, conscientiza-nos de que numa comunidade de discípulos de Cristo só é possível “um só coração e uma só alma” (cf. At 4,32), e de que a divisão das tarefas é boa e eficaz (cf. At 6, 1-7), de que servindo às pessoas necessitadas é preciso ser criativo, utilizar-se de diversas formas e meios (cf. 2Cor 8,9-13). Pela sua vida, o Padre Sigismundo nos dá o exemplo de quem doa com generosidade e alegria (cf. 2Cor 9,6-15), de um caridoso samaritano (cf. Lc 10,30-37), que vive com as palavras de Jesus: “Cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25, 40).

Foi esse o depósito de fé e o carisma que o Padre Sigismundo transmitiu à primeira geração de Irmãs, que trajando o primitivo traje religioso estão localizadas no centro da composição inferior do ícone. Visto que esse mesmo carisma continua sendo concedido a pessoas chamadas à nossa Família religiosa, e de uma nova forma realizado e desenvolvido na história da Congregação, no ícone vemos igualmente Irmãs com o atual traje preto e cinza missionário. O traje religioso que muda simboliza igualmente a necessidade de uma dinâmica e criativa fidelidade à missão da Congregação, em postura de submissão diante das inspirações divinas, adaptando as formas aos novos tempos mutantes e às necessidades da Igreja… Onde e de onde, no dia a dia, uma josefita deve haurir força e vigor para fazer o bem aos outros em espírito de caridade? No ícone, com as suas mãos as Irmãs apontam para duas direções: o “Poço da Sabedoria Divina” e o olhar “para cima”. O Poço da Sabedoria Divina é o símbolo de Cristo – pulsando com uma água viva por nada turvada e ilimitada, que é utilizada no Batismo. A Água do

Batismo tem o poder de nos tornar santos e imaculados, é um sinal visível do poder de Cristo, aprofundado na consagração religiosa. A Água é também o símbolo do Espírito Divino, porque Jesus disse: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba. Quem crê em mim, como diz a Escritura, de seu seio jorrarão rios de água viva. Ele falava do Espírito que deviam receber os que nele cressem” (Jo 7,38-39). Como se percebe, a Sabedoria Divina nos leva igualmente a haurir da Palavra Divina, tão generosamente oferecida na Liturgia cotidiana. O olhar para cima simboliza primeiramente os ideais da nossa Família religiosa e os caminhos para a sua realização contida na Legislação e na Tradição, que simbolicamente são apresentadas pela marca da Congregação. Olhando mais longe através dela, encontramos Cristo e Sua Mãe, bem como os santos Padroeiros e as potências celestiais. Sobre tudo que se encontra no céu e na Terra vela o misterioso e amoroso Braço da Divina Providência, que tudo sustenta na existência e tudo dirige[28], enviando continuamente o Espírito Santo – Espírito da Verdade – aos nossos corações (cf. Jo 14,15-17), para o descobrirmos no centro da nossa vida, como Maria, cujo nome traz cada uma de nós. Entre as Irmãs percebemos também uma representante dos “Grupos de Oração de S. José”, e na pessoa de um homem – todas aquelas pessoas com quem colaboramos e que encontramos nos caminhos da nossa vida. A sua localização na comunidade das Irmãs significa que somos enviadas para edificar a comunhão com as pessoas leigas, que são convidadas a se envolverem no nosso ministério carismático e a uma participação mais profunda na espiritualidade da nossa Congregação. As nossas comunidades devem tornar-se para essas pessoas lugares de esperança e de vivência direta do espírito dos conselhos evangélicos, onde o amor, que extrai a sua força da oração, fonte de comunhão, torna-se a norma da vida e uma fonte de alegria. Isso poderá estimular as pessoas leigas a viverem com o espírito das Bem-Aventuranças e a darem testemunho delas, buscando a transformação do mundo de acordo com o propósito Divino[29].

Detenhamos ainda o nosso olhar no lema da Congregação, forma simbolicamente apresentada de realização do carisma, em que está inscrita a divisa da nossa Família religiosa: CORAÇÃO EM DEUS, MÃOS AO TRABALHO[30]. Vale a pena deter-se por um momento sobre a profundeza da mensagem que esse lema apresenta. Primeiramente o “coração” do discípulo é convidado a fazer companhia a Jesus, e somente a partir dessa proximidade e intimidade é que surgem os atos de amor. Essa é justamente a verdade proclamada pelo Evangelho: “E constituiu Doze, para que ficassem com Ele, para enviá-los a pregar, e terem autoridade para expulsar os demônios” (Mc 3,14-15).

O lema está localizado sobre um fundo dourado, que significa o sobrenatural, porque o carisma e a espiritualidade da Congregação são um dom divino. No gesto das mãos josefitas estendidas, que distribuem o pão com amor e o depositam ao pé da Cruz, percebemos a inspiração carismática do Fundador, para nas pessoas necessitadas aqui e agora, guiando-nos pelo espírito de fé e amor, vermos Cristo e Lhe servirmos infundindo nos corações aflitos a esperança, porquanto Ele disse: “Cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25,40). O pão é o símbolo daquilo que é mais necessário para a vida. Ele é também a matéria da Eucaristia, sob a espécie da qual oculta-se o Deus vivo. Isso significa que, praticando atos de caridade, é preciso dar ao Cristo Pobre aquilo que é necessário para a vida temporal e eterna. O coração, que no ícone é representado em cor dourada, é o símbolo de um coração repleto de amor sobrenatural, mostrando que somente com esse tipo de coração é que podemos dirigir-nos às pessoas. Ensinava o Padre Sigismundo: “A caridade seja a nossa mãe, porque aquele que alimenta com o pão da Palavra Divina a quem tem fome, aquele que dá de beber a bebida da sabedoria a quem tem sede, aquele que conduz o perdido para casa, que defende o inocente, que fortalece o fraco na fé e na paciência, que na aflição consola e participa da dor alheia, este é realmente piedoso, realmente caridoso e verdadeiramente amigo de Deus”[31].

Olhemos ainda para as potências celestiais. O anjo vestido de branco, em postura de adoração repleta de respeito, segura em suas mãos, através do tecido, o cálice, símbolo da Eucaristia – ilimitado e misericordioso amor de Deus. Na Eucaristia o mais frágil amor humano se torna divinizado; torna-se participante da natureza divina (cf. 2Pd 1,4). O Cálice sugere a associação não apenas com a Última Ceia, mas também com o cálice do Horto, cálice de amargor e sofrimento e da amarga Paixão de Jesus, que é o prenúncio da Ressurreição. Isso é simbolizado pelo cálice dourado sobre o espaço dourado do ícone.

O Serafim vermelho como o fogo adora a Cruz de Cristo, da qual “pendeu a Salvação do mundo”. Com respeito preserva também os instrumentos da Paixão de que se serviu para marcar São Francisco com as chagas de Cristo. A cor do manto do Serafim expressa o fogo, a veemência do amor e a purificação espiritual. Esses símbolos iconográficos mostram que a busca da santidade exige a luta espiritual[32], por isso, para crescer até a plenitude assinalada, é preciso praticar a ascese pessoal e comunitária, que purifica e transforma toda a vida[33] e permite viver em Cristo e com Cristo, bem como alegremente anunciar ao mundo a Sua Ressurreição[34].

Envolvamos ainda com o olhar e o coração todo o ícone. Facilmente se pode perceber que a composição inferior da peregrinação terrena da Congregação é como uma casa firmemente arraigada na Igreja, cuja cúpula simbólica se estende sobre as santas Figuras e não termina. A cúpula é encimada por uma dupla circunscrição como uma aliança de casamento, na qual o Espírito Santo, em forma de pomba, amorosamente estende as Suas asas. Como casa de Deus, somos edificados neste mundo para que no seu fim sejamos pelos séculos santificados[35]. A construção ou a edificação vem acompanhada de esforço, de luta, o que algumas vezes se apresenta como as estações da via-sacra, simbolicamente apresentadas na composição ondulante dos crucifixos das Irmãs. Por sua vez a dedicação vem acompanhada de alegria e paz. Entretanto não nos tornaremos uma casa de Deus enquanto não nos amarmos mutuamente, como Ele nos amou (cf. Jo 13, 34). Cada uma de nós deve, portanto empreender um esforço para criar dentro da comunidade aquele ambiente de amor que assinalou a Sagrada Família em Nazaré, onde a comunidade de oração, trabalho e serviço mútuo era uma força que enriquecia os seus Membros[36]. Nesse ícone cada Santo se encontra em sua própria nuvenzinha, mas elas estão unidas entre si[37]. Assim também na comunidade, a partir da diversidade dos carismas pessoais devemos tornar-nos, graças ao poder de Deus, “um só coração e uma só alma” (cf. At 4,32) e edificar um ambiente familiar, em cujo centro estará Cristo, e cuja única e suprema lei será o mandamento do amor a Deus e ao próximo.

Na composição do ícone os Santos não se distinguem pela altura, visto que todos eles estão inscritos na espiritualidade da nossa Congregação e tornaram-se para nós um modelo de entrega da vida a serviço de Deus; e nós, rezando, tentamos fazer a nossa interpretação e haurir da beleza da espiritualidade deles, mas o poder da ação de cada um desses Santos para a moldagem da vida espiritual de uma josefita concreta é conhecido apenas por Deus.

Quando contemplamos o Ícone da Espiritualidade da nossa Família religiosa, experimentamos uma proximidade especial com as Pessoas nele representadas. Por isso, do fundo dos nossos corações exclamemos:

Santíssima Trindade, que sois bendita e que abençoais, enchei da Vossa bênção a nós, a quem chamastes para que proclamemos a grandeza do Vosso amor, da Vossa misericordiosa bondade e da Vossa Beleza.

Deus Pai, santifique, Vossas filhas que se consagraram a Vós pela glória do Vosso nome. Ajudai-nos pelo Vosso poder, para que possamos testemunhar que Vós sois o princípio de tudo, a única fonte do amor e da liberdade. Nós Vos damos graças pelo dom da vida consagrada, que com fé busca a Vós e, cumprindo a sua missão universal, convoca a todos a que se encaminhem para Vós.

Jesus Salvador, Verbo Encarnado, Vós que nos confiastes o dom de Vos imitar na consagração religiosa, fazei com que, amando-Vos cada vez mais, sejamos para o homem de hoje testemunhas da Vossa misericórdia, prenúncio da Vossa volta, sinal vivo dos bens da futura ressurreição. Que nenhuma provação nos afaste do Vosso amor.

Espírito Santo, Amor derramado nos corações, que conduzis até o fim a missão de Cristo através de variados carismas, nós Vos pedimos, infundi em nossos corações a profunda certeza de que fomos escolhidas para amar, adorar e servir. Permiti nos experimentar a Vossa amizade, enchei-nos da Vossa alegria e do Vosso consolo, ajudai a superar os momentos de dificuldades, iluminai nas dúvidas e na interpretação mais profunda do carisma da Congregação. Dai-nos a coragem de aceitar os desafios dos nossos tempos e a graça de apresentar aos homens a bondade e a humanidade do nosso Salvador Jesus Cristo[38].

Vós, Maria Imaculada, que desejais a renovação espiritual e apostólica dos Vossos filhos pelo amor a Cristo e pela total entrega a Ele, dirigimos com confiança a nossa oração. Maria, Mãe da esperança e da grande confiança, permanecei conosco em nossos caminhos. Vós, que cumpris a vontade do Pai, intercedei por nós, que atuamos na história, certas de que o plano do Pai se cumprirá.

São José, a Vós Deus revelou pelo Anjo o Mistério da Encarnação do Filho de Deus. Ajudai-nos a ouvir incessantemente a voz de Deus em nossos corações e a interpretar corretamente os Seus apelos. Alcançai-nos também junto a Jesus a graça daquela disponibilidade diante das exigências e dos planos divinos de que nos fornecestes um modelo na doação total de Vós mesmo para o Senhor. Nosso amado Pai, à Vossa paternal proteção entregamos toda a nossa Família Religiosa e suplicamos que ela se desenvolva para a glória de Deus.

Santo Pai Sigismundo, Vós, abrindo-vos à ação do Espírito Santo soubestes interpretar os “sinais do tempo” e generosamente responder às necessidades da Igreja e do mundo. Ensinai-nos a sair ao encontro das pessoas necessitadas e lhes proporcionar ajuda, e, sobretudo e lhes levar Jesus. Amparai-nos no trabalho pelo bem dos pobres, dos famintos, dos privados de esperança, para nos tornarmos um sinal e um instrumento da afetuosa bondade de Deus diante do mundo inteiro.

São Francisco, Santa Isabel, Santos Anjos e todas as nossas piedosas Antecessoras, alcançai-nos o zelo e o entusiasmo para o radicalismo evangélico e o alegre serviço aos irmãos.

Isto Vos pedimos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.

 

 [1]   L. Uspienski. Teologia Ikony, Poznan 1993, p. 13-22

[2]  Cf. L. Potyrała OSJ. Ikona. Katechetyczna funkcja ikonyKraków, 1998, p. 59.

[3]  M. Bielawski. Blask ikon. Kraków, 2005, p. 9.   

[4]  Cf. Ir. G. W. Dryl OSU. Kontemplacja ikony, Chrystus i Abba  Menas. Kraków, 2010.

[5]  Cf. ibidem.

[6]  Cf. João Paulo II. Exortação apostólica pós-sinodal Vita Consecrata, n. 36.

[7]  Cf. J. Różycka-Klejnowska; Pe. D. Klejnowski-Różycki. Studium  ikony. Zabrze, 2011, p. 173.

[8]   Cf. P. Liszka CMF. Charyzmatyczna moc życia zakonnego. Wrocław, 1996, p. 144.

[9]   Cf. Constituições da Congregação das Irmãs de S. José, 96.

[10]  Cf. João Paulo II. Vita consecrata, n. 101.

[11]  Cf. O Popova; E. Smirnova; P. Cortesi. Ikony. Warszawa, 2003,  p. 119.

[12]  Cf. J. Różycka-Klejnowska; Pe. D. Klejnowski-Różycki. Studium…, op. cit., p. 383.

[13] É o novo nome de Maria recebido durante a Anunciação. Cf. João Paulo II. Redemptoris Mater. Vaticano, 1987, n. 7.

[14]   Cf. J. Różycka-Klejnowska; Pe. Klejnowski-Różycki. Studium…, op. cit., p. 383.

[15]   João Paulo II. Redemptoris Custos. Vaticano, 1989, n. 5.

[16]   Cf. Constituições…, 28.

[17]   Cf. ibidem, 314

[18]  Cf. Relacja Trzech Towarzyszy. In: Wczesne źródła  franiszkańskie. Red. S. Kafel OFM Cap. Warszawa, 1981, vol. II, p. 49.

[19]   Cf. Relacja Trzech Towarzyszy…, p. 26.

[20]   Cf. Constituições…, 97.

[21]   Cf. Ir. G. W. Dryl OSU. Kontemplacja…, op. cit.

[22]   Cf. List do wiernych (redakcja pierwsza). In: Pisma św. Franciszka z Asyżu. Ojcowie Kapucyni. Warszawa, 1990, 148.

[23]   Cf. Ir. E. Mazurek CSSJ. Impresje o Patronach naszego Zgromadzenia. In: Sesja dla Sióstr Przełożonych i Formatorek. Kraków, 13-05.06.2011.

[24]   No dia 20.04.1905 o Pe. Sigismundo Gorazdowski foi nomeado pela Santa Sé Camareiro secreto do Santo Padre Pio X.

[25]   Pe. S. Gorazdowski. Testamento, 1918.

[26]  Bento XVI. Homilia de canonização. Roma, 23.10.2005.

[27]   Cf. Decreto sobre o heroísmo das virtudes do Pe. Sigismundo Gorazdowski. Roma, 20.12.1999.

[28]   Cf. Hymn. Godzina Czytań. Pallotinum, 1988, vol. 4, p. 748; 862.

[29]   Cf. João Paulo II. Vita consecrata, n. 51, 54, 55.

[30]   O logo e o lema assim formulados entraram na tradição josefita no âmbito da renovação conciliar da Congregação. O projeto foi da Ir. Elekta Lasko, e a realização – da juniorista Ir. Inês Agnieszka Maniak.

[31]  Pe. S. Gorazdowski. Zamknięcie rachunków i wykaz czynności Towarzystwa Miłosierdzia pod godłem “Opatrzności” we Lwowie za czas od 1 lutego 1882 do 31 stycznia 1883. Lwów, 1883.

[32]   Cf. João Paulo II. Vita consecrata, n. 38.

[33]   Cf. ibidem, n. 103.

[34]   Cf. Constituições…, 74.

[35]   Cf. S. Agostinho. Liturgia godzin…, vol. I, p. 1046.

[36]   Cf. Constituições…, 14.

[37]  Cada santo se encontra em sua própria nuvenzinha, o que é um sinal da sua singularidade, e a nuvem é o símbolo do Espírito Santo.

[38]   Cf. João Paulo II. Vita consecrata, n. 111.